Todo mundo sabe que precisa descansar. Nem todo mundo consegue colocar em prática, principalmente se for sem culpa. A cultura da produtividade faz com que sintamos que é necessário produzir o tempo todo, trabalhar o tempo todo ou sempre estar fazendo algo "útil". As vezes isso faz com que a procrastinação invada e você se paralise, sem conseguir fazer nada ao mesmo tempo que não está descansando.
Mas, todo mundo sabe, mesmo se for lá no fundo, que precisa descansar.
Atendo muitas pessoas no consultório que são extremamente aceleradas e estão presas nessa rotina de fazer mais coisa do que dão conta. E muitas vezes, essa ansiedade se canaliza na comida, e ela vira alívio, amor, afeto, acolhimento... pelo menos por alguns minutos. Quase sempre, esse momento de alívio que a comida proporciona vem acompanhado de culpa - pensando racionalmente, não vale a pena comer sua ansiedade/frustração, porque você busca sentimentos positivos e acaba ficando apenas com a culpa, mas o impulso de comer é irracional e quase incontrolável.
Quando alguém chega com essa queixa, sei que o tratamento será multidisciplinar, que a psicoterapia levará essa pessoa em direção à solução, mas como pode levar um tempo pra chegar lá, sugiro algumas estratégias para fazer no caminho.
Primeiro, pergunto o que a pessoa gosta de fazer em seu tempo livre, o que faz pra ela mesma, o que faz ela sentir prazer e felicidade exclusivamente. Quando sabem responder, tento encaixar uma dessas atividades no lugar da comida, nos momentos em que há o desejo de aliviar seus sentimentos comendo. Surpreendentemente (mas nem tanto), muitas pessoas não sabem o que responder nessa hora. Ficam pensando e levam de lição de casa. As vezes, a resposta é: "nada". Nesse caso, sugiro que a pessoa explore hobbies, experimente fazer atividade novas, atividades com as mãos, como pintura, desenho e escrita, com o corpo, como alguma atividade física, algum jogo que não requeira telas... é realmente uma exploração.
A escrita, apesar de desconfortável no começo, pode ser uma ferramenta muito útil. É um jeito de tirar todos aqueles pensamentos da cabeça e colocar no papel, um lugar onde vai ser possível consultar, é uma atividade que requer atenção, requer que você pense no que vai escrever e reflita ao mesmo tempo que escreve. Nem todos estão prontos pra receberem essa sugestão, mas é valiosa.
Eu chamo essas estratégias de band-aid. É como se a psicoterapia e o autoconhecimento fossem o sistema imunológico e os medicamentos, que vão fazer com que a ferida se cure, e as estratégias que fazemos enquanto isso são o band-aid, uma proteção temporária.
Outra coisa que recomendo é o desenvolvimento da consciência alimentar, principalmente durante os momentos em que comer não é um impulso (para a maioria das pessoas, é o período da manhã até o começo da tarde). Nessas refeições, é importante prestar atenção no que está comendo, sentir o cheiro, sabor e textura do alimento, perceber como o seu corpo recebe essa comida, como ele passa do estado de fome para o de saciedade, quais sensações estão envolvidas no processo. Desenvolvendo essa consciência, na hora em que quiser comer suas emoções, há mais chances de pensar duas vezes, já que aquele cenário (comer sem nenhum sinal de fome, por exemplo) não é o usual ou fisiológico.
Essas são algumas estratégias, alguns desvios, algumas propostas para quem come seus sentimento e suas emoções. Cada pessoa é única e a individualidade deve prevalecer quando pensamos em qualquer tipo de tratamento. Reflexões como essas podem funcionar, pode ser que seja necessário mais tempo de adaptação ou de implementação ou pode ser que a situação seja um pouco mais complicada e o caso seja encaminhado para outras especialidades, mas isso será decidido e analisado em consulta, conhecendo e entendendo cada ser humano que passa por aqui.
Pare de comer seus sentimentos, busque ajuda acolhedora de profissionais que você possa confiar.
Comments